Solenidade aconteceu na sede da associação; entidade recebeu da Univale um selo de parceria
A Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis Natureza Viva (Ascanavi) completou, na semana passada, duas décadas de fundação em Governador Valadares. A data foi comemorada ontem (31), na sede da entidade, no bairro Turmalina, numa cerimônia simples, mas carregada de muita emoção nas histórias e testemunhos de algumas catadoras e apoiadoras que participaram de sua concepção, ainda em 2001.
A solenidade contou com a presença da primeira-dama de Valadares, Andreia Merlo, de apoiadores e parceiros da associação e da professora Marlene Temponi, que, representando a Universidade Vale do Rio Doce (Univale), entregou à coordenadora da entidade, Silvana Amorim, um selo simbolizando a parceria entre as duas instituições.
Uma fala recorrente nos depoimentos era de como o surgimento da Ascanavi mudou a vida de muitas pessoas que, até o início dos anos 2000, sustentavam suas famílias recolhendo objetos no lixão a céu aberto. Desde então, as histórias de muitas dessas famílias mudaram significativamente:
“Me lembro de quando estava iniciando a carreira no jornalismo, no Diário do Rio Doce, no ano 2000. Fui ao antigo lixão do Turmalina várias vezes. Vi cenas que nunca vou esquecer. À medida que os caminhões de lixo iam chegando e despejando o conteúdo das caçambas, as pessoas avançavam em busca de material reciclável, de roupas e utensílios que pudessem reaproveitar e até de restos de comida. A Ascanavi, muitas vezes invisibilizada aos olhos da sociedade, não só fez muito bem para a cidade no que diz respeito à ideia de sustentabilidade, mas salvou a vida de muita gente”, relata o jornalista e professor Franco Dani, que coordenou um projeto nos cursos de Jornalismo e de Publicidade e Propaganda da Univale. Projeto este que, entre outras conquistas, resultou na criação de um selo comemorativo dos 20 anos da Ascanavi.
A Ascanavi
Esta história começou ainda em 1999, com o Grupo Fermento (movimento ligado à Diocese de Governador Valadares), encabeçado pelo Padre Antônio Amort, que hoje, aposentado, reside na Itália. Num trabalho evangelístico, ele começou a fazer visitas ao antigo lixão do Turmalina para conhecer a realidade dos catadores. O Fermento fazia parte um grupo da Igreja Católica, que tinha como objetivo acompanhar pessoas em situação de vulnerabilidade. Antes, eles monitoraram vários setores da cidade, até chegarem às famílias que trabalhavam no lixão. Foi o primeiro passo para que estas pessoas deixassem de ser catadoras de lixo para serem recicladoras e agentes de preservação do meio ambiente.
Na tentativa de ajudar os catadores, o Grupo Fermento buscou exemplos em outras cidades para fazer este trabalho em Valadares. Eles entendiam a importância do trabalho dos catadores que tiravam o sustento do lixo, mas sabiam que ali não era lugar para aquelas pessoas, e que elas poderiam sair desta situação e se organizar em associação, tendo, assim, um espaço digno de trabalho e com uma renda melhor. Em 2001, os catadores se uniram com apoio de setores organizados da sociedade, como a igreja, poderes públicos e a Univale, para criar a associação, cuja primeira reunião oficial, registrada em ATA, aconteceu no dia 26 de janeiro de 2002. O CNPJ (Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica) da entidade foi aberto no dia 29 daquele mês e, então, a Ascanavi virou realidade.
Para a educadora Marinalva Alves de Oliveira, ex-membro do Grupo Fermento, e que também esteve presente na cerimônia de ontem, existem dois momentos marcantes na história da Ascanavi: ver a força das mulheres catadoras, que dão conta dos trabalhos de casa e são, segundo ela, “as principais peças da associação”, e o outro momento foi o lançamento do livro “Reciclando Palavra”, em 2014, organizado pela pedagoga e professora da Univale Maria Celeste.
O objetivo da obra foi documentar a história da associação, mas de uma maneira diferente, pois a trajetória de cada catador, desde a saída do “lixão” até a concretização do projeto da Ascanavi, é contada por eles mesmos. “Muitos catadores não sabiam ler e escrever, mas com parceria da Univale tiveram aulas no projeto de letramento, que os alfabetizaram dentro da realidade que eles viviam no seu dia a dia, como a própria contabilidade da associação, e assim aprenderam, além de ler e escrever, um pouco sobre gestão, renda, divisão de trabalho”, lembra Marinalva.
Mesmo com o apoio de alguns setores da sociedade, a associação enfrentou muitas dificuldades, como em relação à coleta de lixo, principalmente em relação ao descarte incorreto feito por uma parcela da população, que não se conscientiza na hora de separar material seco do úmido. Dessa forma, muito do que poderia ser reaproveitado acaba se perdendo. É comum, por exemplo, o descarte de caixas de leite na mesma embalagem de filtros de café usados e umedecidos, ou ainda, papéis com restos de comida. O lixo seco em contato com o úmido geralmente fica impróprio para reaproveitamento, e costuma ser levado para o aterro sanitário, no Vale do Aço. Uma atitude ruim para a associação, que hoje conta com pouco mais de 50 membros, para as famílias que dependem da renda do lixo reciclável e para o meio ambiente.
Parceria e selo
A parceria da Ascanavi com a Univale quase se confunde com a história da própria associação. Além de ter participado do movimento de organização da entidade e do livro “Reciclando Palavra”, a universidade vem apoiando outros projetos. Um dos mais recentes aconteceu em 2017, quando a Univale concorreu a um edital do Instituto MRV, com um projeto de educação ambiental que propunha a organização de uma rede solidária de apoio à Ascanavi, tendo como objetivo a ampliação e melhoria da coleta seletiva em Valadares. O projeto foi selecionado e isso possibilitou investimento em qualificação dos catadores, os quais receberam formação técnica e cursos de capacitação para aprimoramento das atividades na associação, além de melhorias na estrutura física de sua sede.
Em 2021, ano que antecedeu o aniversário de 20 anos da Ascanavi, os cursos de Jornalismo e de Publicidade e Propaganda da Univale resolveram antecipar o presente. Por meio de um projeto de extensão voltado para a temática da sustentabilidade e meio ambiente, os alunos criaram o selo comemorativo de 20 anos e produziram pequenos vídeos-depoimentos com pessoas que, de alguma forma, contribuíram para o surgimento e fortalecimento da Ascanavi.
O material está sendo publicado pela própria associação, em suas mídias sociais. Estas foram apenas algumas das ações, frutos da parceria entre Univale e Ascanavi, lembradas pela professora Marlene Temponi, ao entregar para a coordenadora da Ascanavi, Silvana Amorim, uma placa com o selo que simboliza a parceria entre as duas instituições. (Com Ludmila Galdino e Igor Simil/Univale)
Informações: Univale