O Senado aprovou nessa quinta-feira (10) o Projeto de Lei (PL) 3.964/2019 que permite a realização de apresentações culturais e manifestações artísticas em infraestruturas de mobilidade urbana, como vias públicas, estações e paradas de transporte, estacionamentos — e inclusive no interior de veículos de transporte coletivo. O projeto, do senador Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB), ganhou emendas propostas pelo relator, senador Eduardo Gomes. Agora a matéria segue para análise da Câmara dos Deputados.
O texto estabelece que o poder público incentivará e garantirá o exercício dos direitos culturais no âmbito dos serviços públicos de mobilidade urbana. São permitidas apresentações culturais e manifestações artísticas nos espaços estabelecidos pela Lei 12.587, de 2012 (Política Nacional de Mobilidade Urbana). São eles: vias e demais logradouros públicos (inclusive metroferrovias, hidrovias e ciclovias); estacionamentos; terminais, estações e demais conexões; pontos para embarque e desembarque de passageiros e cargas; sinalização viária e de trânsito; equipamentos e instalações; e instrumentos de controle, fiscalização, arrecadação de taxas e tarifas e difusão de informações.
O projeto define como apresentação cultural: canto, uso de instrumentos musicais, poesia, teatro, dança e outras manifestações artísticas; além de exposições de artes plásticas e visuais. A regra valerá para serviços de transporte prestados direta ou indiretamente pela administração pública de todas as esferas do poder público.
Eduardo Gomes apresentou emenda com critérios objetivos para essas apresentações “que assegurem a ampla liberdade do exercício da atividade artística e o tratamento isonômico dos interessados em realizar apresentações culturais”. Pela emenda, as apresentações terão que seguir os seguintes requisitos: não comprometer a função original das infraestruturas; não prejudicar o bem-estar de seus usuários; não frustrar o uso especial do espaço e nem outras apresentações que estejam ocorrendo simultaneamente.
As apresentações terão quer ser gratuitas, exceto se houver autorização do poder público para cobrança. Mas o artista também poderá pedir contribuições espontâneas do público. Outra emenda apresentada também deixa claro que as apresentações culturais possam ocorrer no interior dos veículos de transporte coletivo urbano (metrôs, ônibus, balsas, entre outros). A única observação é que terão que ser observadas as regras de acesso ao serviço e utilização. Eduardo Gomes também apresentou emendas de redação e de aperfeiçoamento da técnica legislativa. Uma delas é para a adequação dos termos usados no projeto — para serem compatibilizados com os termos da Lei 12.587.
Arte de rua
Na leitura de seu relatório, o senador Eduardo Gomes (MDB-TO) destacou que, desde o princípio da civilização, ou até mesmo antes dela, a arte fez parte do DNA humano. Algo demonstrado inicialmente na arte rupestre, mas que hoje se reflete principalmente na arte de rua, que é aquela em que os artistas estão mais próximos da população. Sendo assim, ela pode se manifestar na pintura, no grafite, na música, na escultura, na dança e em várias outras formas.
— No Brasil, arte de rua também é bastante disseminada. Nas grandes e pequenas cidades de todo o país encontram-se artistas que se valem dos espaços públicos para fazer chegar a sua arte onde o povo está. No entanto, apesar da tradição, também são frequentes os conflitos com as autoridades públicas locais, que tentam impedir a apresentação desses artistas em nome da segurança, da ordem pública etc. Em alguns estados e municípios, existem leis locais que regulamentam essa prática, mas, em muitos outros, essas apresentações são proibidas e reprimidas, de modo que o artista de rua não raro atua sem garantias e proteção para exercer o seu trabalho com segurança. Em decorrência desse quadro, a iniciativa em análise pretende instituir uma legislação nacional que garanta o direito ao exercício das manifestações artísticas e culturais em espaços públicos — destacou o relator.
Durante a discussão do projeto, o senador Carlos Viana (PSD-MG) questionou se, com a aprovação do texto, as prefeituras e poderes locais manteriam naturalmente o poder de organizar e tornar a atividade artística adequada às suas regras. O relator esclareceu que esse foi um dos motivos que o levou a apresentar emenda ajustando o texto ao ordenamento público, à Lei do Silêncio e ao Estatuto das Cidades, mantendo, assim, as atribuições próprias dos estados e municípios.
Acesso à cultura
De acordo com Veneziano Vital do Rêgo, a realização de apresentações culturais já ocorre diariamente em variadas cidades brasileiras. “Nossa intenção é proteger e incentivar a prática, garantindo aos artistas profissionais o direito ao trabalho”, disse na justificação do projeto.
“Nosso país é reconhecido pela sua diversidade cultural e pela criatividade de seus artistas. Seja na música, na dança, no teatro ou nas artes visuais, as manifestações artísticas proliferam e merecem tanto reconhecimento quanto remuneração justa. Os artistas, portanto, partem ao encontro de seu público. ‘Todo artista tem que ir aonde o povo está’, como já diziam Milton Nascimento e Fernando Brant. E o povo está nos transportes públicos, seja nas estações de metrô São Paulo, seja no trajeto das balsas do Rio de Janeiro ou nas estações de ônibus de Campina Grande”, acrescentou.
Eduardo Gomes concordou com o autor. Ele lembra que, “apesar da tradição, também são frequentes os conflitos com as autoridades públicas locais, que tentam impedir a apresentação desses artistas em nome da segurança, da ordem pública etc. Em alguns estados e municípios, existem leis locais que regulamentam essa prática, mas, em muitos outros, essas apresentações são proibidas e reprimidas, de modo que o artista de rua não raro atua sem garantias e proteção para exercer o seu trabalho com segurança”.
No relatório, Eduardo Gomes aponta para um problema de falta de competência da esfera federal para legislar sobre questões locais, próprias das prerrogativas de estados e municípios. Mas ele argumenta que “não se pode ignorar que o PL tem por escopo assegurar o exercício de uma liberdade protegida pela Constituição Federal: a liberdade de expressão artística (art. 5º, IX). E não faria sentido que, em nome de sua prerrogativa de gerir bens de seu domínio, estados e municípios recebessem carta branca para limitar caprichosamente o exercício daquela liberdade”. Portanto, acrescenta, “não é despropositado que a União estabeleça normas gerais assecuratórias do exercício de atividades culturais em infraestruturas de mobilidade urbana”. Fonte: Agência Senado