A prestação de serviços em diversas áreas é um dos atrativos que fazem com que consumidores e profissionais se desloquem de várias regiões de Minas, do Brasil e até do exterior para Governador Valadares. Serviços médicos, odontológicos, educação, lapidação, ópticos, formação de mão de obra e uma gama de outros que dão suporte ao comércio e à indústria. Encerrando esta série de reportagens sobre a economia de Governador Valadares, o DIÁRIO DO RIO DOCE entrevistou a economista, doutora em gestão e atual secretária de Planejamento, Zenólia Almeida, que tem uma ampla bagagem para falar sobre a atividade terciária em nosso município.
DRD — O setor de serviços é um dos suportes importantes para a economia de um município, estado e país. Historicamente, a senhora acha que ele tem esse reconhecimento dentro das políticas de desenvolvimento?
Zenólia — Presentes na economia mundial desde a Antiguidade Clássica, porém, historicamente marginalizadas nos estudos de economia, as atividades do comércio e serviços já foram consideradas como “não produtivas”. Nos dias atuais, o setor ainda é definido em termos residuais — tudo aquilo que não pertence às atividades agropecuárias ou à manufatura. O setor de serviços, também conhecido como setor terciário, foi tratado como setor improdutivo até os anos 1930 e 1940. Seu papel era apenas complementar os setores primário e secundário, já que esses fornecem os produtos necessários ao setor terciário. Ao longo do tempo, o setor de serviços passou a ser motivo de estudos, principalmente a partir de meados do século XX, devido a crescentes aumentos na participação do setor terciário no produto total dos países (Banco Mundial, 2013).
DRD — A partir de quando o setor terciário passou a ser valorizado como atividade que tem importância no conjunto da economia global?
Zenólia — Com o tempo, o crescimento da participação do emprego e do valor agregado no setor de serviços, associado à emergência das tecnologias de informação e comunicação como um vetor de inovação em outros setores da economia, despertou melhor entendimento em relação às especificidades das atividades de serviços, fazendo com que ganhassem mais importância. Hoje, a modernas economias são marcadas pelo crescimento do setor terciário na composição do PIB. Enquanto no passado o setor industrial era o carro chefe das economias desenvolvidas, hoje o PIB desses países é marcado por uma participação crescente.
DRD — Qual a importância do setor terciário na participação do PIB brasileiro?
Zenólia — No Brasil, o setor de serviços (comércio, transporte, salões de beleza, imobiliárias, oficinas mecânicas, agências de turismo, escritórios de advocacia, transporte, armazenamento, correios e serviços de informação; todos estes segmentos, dentre outros) foi responsável por 75,8% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2018 (IBGE). A inflação, os juros baixos e o desemprego ligeiramente menor que o do ano anterior contribuíram para o avanço desse segmento. Também, a liberação de alguns benefícios, tais como Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e seguro-desemprego, pode ter ajudado no aumento do consumo, refletindo no comércio e também na parte de outros serviços. A representatividade do setor terciário, de 2003 a 2015 (pelo acumulado em quatro trimestres até o 2º trimestre de 2015), passou de 65,8% para 71,7% do valor adicionado do PIB a preços correntes, segundo dados das Contas Nacionais Trimestrais do IBGE. Os serviços representaram 73,4% do emprego formal em 2014, de acordo com dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) do MTE, sendo que apenas comércio e serviços privados (excluindo a administração pública) constituíram 54,6% do emprego formal total da economia brasileira neste ano.
DRD — E em Governador Valadares?
Zenólia — Governador Valadares é um importante polo econômico do Vale do Rio Doce que exerce influência sobre o leste e o nordeste de Minas Gerais, bem como alguns municípios do estado do Espírito Santo. Sua economia é fortemente marcada por atividades ligadas ao setor terciário (comércio e prestação de serviços), sendo a principal fonte geradora do PIB.
DRD — Que referência a senhora faz quando se fala desse setor em Valadares?
Zenólia — O GV Shopping, inaugurado em dezembro de 1999, é o segundo maior centro de compras do leste mineiro, superado apenas pelo Shopping Vale do Aço. Na cadeia produtiva da rede do turismo, podemos destacar dois serviços: hospedagem (temos uma farta rede hoteleira) e o setor de alimentos e bebidas (há uma variedade gastronômica, desde comida mexicana, americana, chinesa, japonesa, italiana, árabe, além da comida mineira). Vários serviços profissionais são disponibilizados na cidade nas áreas de educação, saúde, engenharia, jurídicos, segurança do trabalho, consultorias, gestão, informática, dentre outros.
DRD — Sempre se falou na promoção do turismo em Governador Valadares. Num tempo não muito distante, esse setor caiu no esquecimento, mas agora o assunto ressurgiu e há uma grande mobilização para que o turismo possa ser a grande cartada para alavancar a economia da cidade. A senhora acha que esse possa ser um novo ciclo da economia local?
Zenólia — O turismo é um fenômeno em constante desenvolvimento e tem adquirido crescente importância em Governador Valadares, uma vez que é capaz de promover impactos (negativos e positivos) tanto sobre a economia quanto sobre as relações sociais, a cultura e o meio ambiente. É um importante fator de desenvolvimento regional. O turismo de eventos e negócios é um segmento que vem se afirmando como atrativo na região. Temos festas agendadas durante todo o ano (casamentos, formaturas, encontros, congressos, seminários, feiras, exposições, festivais, corrida rústica, festival de inverno, etc.). O município possui atrações turísticas, com destaque para o pico da Ibituruna — pista de caminhada, hotéis campestres, campeonatos estadual, nacional e mundial de voo livre. O turismo de aventura é um segmento com grande potencial para crescer. A Prefeitura possui projetos para estimular o turismo de aventura, tais como tirolesa, prática do arvorismo e parede de escalada. A presença de muitas lagoas (ainda não exploradas) no perímetro urbano da cidade e nos distritos podem propiciar espaços de lazer. As belas cachoeiras nos distritos constituem fatores turísticos, potencialmente atrativos.
DRD — Como o setor terciário se comporta dentro do cenário econômico da cidade?
Zenólia — Quando considerada a trajetória da estrutura econômica de Governador Valadares entre 2007 e 2017, percebe-se o recuo da indústria como geradora de empregos (de 12% para 9%), junto da construção civil (de 5,7% para 3%). Permaneceram praticamente inalterados a agropecuária (de 2,1% para 1,9%), a administração pública (de 13,9% para 13,6%) e o comércio (de 32,2% para 32,1%). Apenas os serviços ganharam empregos (de 34% para 40,4%), com crescimentos notáveis nos segmentos de saúde e serviços sociais e no segmento de atividades administrativas (segmento que engloba desde serviços de administração de edifícios, atividades jurídicas, de contabilidade e auditoria, arquitetura e engenharia, seleção e agenciamento de mão de obra, vigilância e segurança, publicidade, dentre outros).
DRD — Se Valadares não tem grandes indústrias, o que gira a roda da economia do município?
Zenólia — O Produto interno bruto (PIB) de Governador Valadares é o 153º maior do Brasil, destacando-se na área de prestação de serviços, já que o município não possui nenhuma indústria de grande porte implantada. Boa parte da renda da cidade vem do exterior, cujos números são impossíveis de contabilizar, por se tratarem de imigrantes em situação ilegal. O setor de serviços já é a maior e mais influente atividade econômica em nível global. Até mesmo em economias menos desenvolvidas, têm nos serviços a sua atividade predominante. A OCDE estima que, em termos de valor adicionado, os serviços corresponderão a 75% do comércio global até 2025 – hoje os serviços já são 54% do comércio e perfazem a maior parte dos investimentos diretos estrangeiros.
DRD — E o que pode acontecer para que este setor continue forte e ganhe mais destaque na economia?
Zenólia — Em economia, novo conceito vai mudar os conceitos com os quais trabalhamos, uma vez que bens e serviços estão se combinando através de uma relação cada vez mais sinergética e simbiótica para formar um terceiro produto que nem é um bem industrial tradicional, tampouco um serviço convencional. Ex: a GE deixou de ofertar o “produto turbina” para oferecer a “turbina como serviço”, responsabilizando-se pelo funcionamento da mesma. Outro exemplo: “economia digital” — face mais sofisticada da economia de serviços — é, predominantemente, fonte da criação de valor.
DRD — O que precisa para Valadares acompanhar essa evolução?
Zenólia — Somos uma economia de serviços. Para sintonizar-se com o futuro e “garantir um lugar ao sol”, Governador Valadares precisa criar valor agregado aos serviços ofertados, gerando outros benefícios e maior satisfação aos clientes, ampliando negócios, gerando emprego e renda e, em consequência, elevando o PIB.
por Raimundo Santana | Editor-chefe