Relatório que expõe Moraes mobiliza bolsonaristas, mas governo e base minimizam

FOTO: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

RENATO MACHADO, THAÍSA OLIVEIRA E VICTORIA AZEVEDO

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O governo do presidente Lula (PT) e parlamentares da base buscaram minimizar o impacto da divulgação de decisões sigilosas do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes em que determina a derrubada de perfis nas redes sociais.

A visão de membros do governo é a de que se trata de um factoide, que pode provocar um alvoroço na base bolsonarista, mas sem efeitos práticos.

Integrantes do governo optaram por não comentar publicamente o episódio, justamente pela avaliação de que o assunto não terá grandes desdobramentos.

A análise interna é a de que a divulgação do relatório pela comissão do parlamento americano será explorada por apoiadores de Jair Bolsonaro (PL), em particular na mobilização para a manifestação prevista para ocorrer no próximo domingo (21), no Rio de Janeiro.

Um interlocutor do governo disse que a divulgação das decisões não terá nenhum efeito prático e que pode se voltar contra bolsonaristas, considerando que o documento volta a colocar em evidência mensagens golpistas.

Após a divulgação dos documentos, parlamentares da oposição passaram a discutir apresentar novos pedidos de impeachment contra Moraes. Segundo relatos, o deputado Cabo Gilberto Silva (PL-PB) começou a procurar os colegas para colher assinaturas.

Há a avaliação entre os próprios membros da oposição, no entanto, de que esse tema não deverá comover outros setores da Câmara – mas apostam numa mobilização da militância para pressionar qualquer iniciativa no Congresso.

A deputada Carla Zambelli (PL-SP), por sua vez, disse acreditar que isso pode ser encampado por parlamentares de centro e gerar o “reposicionamento de vários membros do Congresso”, porque, na avaliação dela, Lula e Moraes estão enfraquecidos.

“Deve haver um posicionamento do Pacheco e do Lira para fortalecer o Legislativo. Finalmente entenderam que a gente estava vivendo um papel terciário, nem secundário, no que tange a definição do que está acontecendo no Brasil. As pessoas do centro estão vendo isso, não são bobos”, afirmou à Folha de S.Paulo.

A divulgação do relatório mobilizou nas redes sociais aliados de primeira hora de Bolsonaro.

O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente, compartilhou foto do documento e escreveu que “se as redes sociais fossem regulamentadas jamais veríamos o rei nu como estamos vendo”, referindo-se a Moraes. Em outra publicação, afirmou que “o jogo está apenas começando”.

A deputada Bia Kicis (PL-DF) compartilhou a notícia dizendo que os documentos “comprovam que o Judiciário brasileiro forçou o X a censurar perfis”.

Já o senador Marcos do Val (Podemos-ES), um dos alvos de Moraes citados no relatório americano, divulgou o documento por meio de seu WhatsApp –ao qual têm recorrido desde que teve todas as demais redes sociais bloqueadas, em junho do ano passado.

O senador disse em uma das mensagens enviadas à imprensa que entregou parte da documentação divulgada e repetiu, falsamente, que houve participação do governo Lula no ataque aos três Poderes, em 8 de janeiro.

Aliados do presidente no Congresso, por outro lado, aproveitaram a divulgação do relatório para criticar Musk e afirmar que se trata de uma estratégia da extrema-direita para atacar as instituições.

“É urgente botar um paradeiro nessa escalada contra nosso país e nossas instituições. A liberdade que eles proclamam é exclusivamente para oprimir e se impor”, escreveu nas redes sociais a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR).

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também minimizou a divulgação durante a reunião de líderes desta quinta e voltou a defender a regulamentação das redes, segundo relatos feitos à reportagem.

O tema foi levantado pelo senador bolsonarista Eduardo Girão (Novo-CE) –que usou a tribuna do Senado na semana passada para agradecer a Musk em inglês por “apoiar a liberdade de expressão” no Brasil.

Pessoas que estavam presentes afirmam que o presidente do Senado teria cortado logo de início a abordagem de Girão. Teria dito também que a oposição prega gestos do Supremo para pacificar a relação, mas não demonstra estar disposta a fazer o mesmo.

Pacheco, inclusive, teria cobrado que não houve nenhuma manifestação em sua defesa quando foi divulgada a minuta do golpe, sendo que ele era um dos alvos de uma possível prisão.

O presidente também afirmou que um dos problemas da falta de regulamentação é a exposição de crianças. Procurada, a presidência do Senado não quis comentar os termos da conversa durante a reunião de líderes.

O discurso de Pacheco a favor da regulamentação foi reforçado pelo senador Weverton Rocha (PDT-MA), um dos vice-líderes do governo na Casa, de acordo com relatos dos participantes.

Apesar da divulgação ocorrer em um momento em que há um acirramento entre o Legislativo e o Judiciário, cardeais do centrão dizem que isso serve para compor a narrativa da oposição de que há censura nas redes sociais na tentativa de mobilizar a sua militância –mas que o grupo não deverá aderir a esse movimento.

Parlamentares afirmam que o que pode mobilizar os deputados numa ofensiva contra o STF são questões como a discussão do foro privilegiado e medidas que restrinjam operações da Polícia Federal no Congresso. Mas reconhecem que esse movimento deve ser coordenado com o Senado para prosperar.

Eles pontuam também que o encontro de Moraes e o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), nesta semana, pode ter contribuído para um distensionamento desse embate com o Judiciário.

Há também a avaliação compartilhada por deputados governistas e do centrão de que esse foi um assunto suscitado por parlamentares estadunidenses, e que a Casa não pode chancelar uma movimentação que venha de “fora para dentro”.

“Da mesma forma que os parlamentares brasileiros não têm o poder de interferir numa decisão da Suprema Corte americana, os parlamentares americanos também não têm direito de interferir aqui”, diz à Folha de S.Paulo o deputado Eduardo da Fonte (PP-PE), coordenador da frente parlamentar Brasil-Estados Unidos.

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