Adulteração de imagem de passaporte válido não afasta competência estadual para crime de estelionato

​Não sendo constatado prejuízo ou interesse da União, a Justiça estadual é competente para julgar o crime de estelionato, ainda que ele tenha sido cometido com o uso de imagens adulteradas de passaporte válido e de outros documentos emitidos por órgãos públicos federais. Também nessas hipóteses, deve ser respeitada a regra do foro de domicílio da vítima quando o crime envolver depósito, transferência de valores ou cheque sem fundos em poder do banco ou com o pagamento frustrado.

Os entendimentos foram fixados pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao analisar um processo em que havia divergência sobre qual ramo judiciário seria o competente para julgá-lo, se a Justiça Federal ou a estadual; e sobre qual juízo estadual, se do Paraná ou de Pernambuco, deveria ficar com o caso, uma vez afastada a competência federal.

De acordo com os autos, uma empresa chinesa, por meio de sua representação brasileira em Pernambuco, entrou em contato com uma empresa do Paraná para negociar a compra de equipamentos de proteção contra a Covid-19. Para comprovar sua identidade, o suposto representante da empresa paranaense enviou foto de seu passaporte e de outros documentos emitidos no Brasil, com um selo do Ministério da Agricultura.

O negócio foi fechado no valor de 573 mil dólares, depositados em conta bancária nos Estados Unidos. Após o pagamento, a empresa chinesa não conseguiu mais contato com o suposto vendedor, nem recebeu o material.

Foram abertas investigações simultâneas na Justiça Federal e na Justiça do Paraná. No entanto, os autos da vara federal foram posteriormente remetidos ao juízo paranaense, que suscitou o conflito de competência por entender que havia interesse da União no caso, já que foram utilizados no crime passaporte adulterado e símbolo do Ministério da Agricultura.  

Crime não envolveu falsificação de passaporte

Relatora do conflito no STJ, a ministra Laurita Vaz explicou que, embora o estelionatário tenha utilizado imagens digitais adulteradas de um passaporte válido de terceiro para enganar a vítima e receber o depósito no exterior, não há indicação de interesse da União, pois não houve falsificação de passaporte.

“Do mesmo modo, a falsificação de selo ou sinal público (artigo 296 do Código Penal) teria sido utilizada para dar falsa aparência de regularidade ao negócio fraudulento, em prejuízo da empresa vítima, o que não implica lesão aos interesses do Ministério da Agricultura”, afirmou a ministra ao confirmar a competência da Justiça estadual.

Alteração no Código Penal passou a exigir observância à regra do domicílio da vítima

Laurita Vaz também apontou que os atos criminosos não ocorreram no Paraná: na verdade, nas negociações com o suposto autor dos delitos, foi utilizado telefone vinculado ao estado de São Paulo; por outro lado, a vítima estrangeira tem representação em Pernambuco e fez o depósito para empresa sob jurisdição da Justiça do Paraná, local onde noticiou o crime em julho de 2020.

Nesse contexto, a relatora lembrou que, em maio do ano passado, entrou em vigor a Lei 14.155/2021, que acrescentou o parágrafo 4º ao artigo 70 do Código de Processo Penal. Segundo o novo dispositivo, nos crimes de estelionato praticados mediante transferência de valores, a competência deve ser definida pelo local do domicílio da vítima.

“A nova lei é norma processual, de forma que deve ser aplicada de imediato, ainda que os fatos tenham sido anteriormente praticados, uma vez que a persecução ainda está em fase de inquérito policial, razão pela qual a competência no caso é do juízo do domicílio da vítima”, concluiu a ministra, fixando a competência da Justiça estadual de Pernambuco. Superior Tribunal de Justiça

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