Ex-candidato a prefeito e militante comunista, Jó critica política de conciliação de governos do PT

Os livros de história registram a queda do Muro de Berlim, em 1989, e o colapso da União Soviética, em 1991, como marcos do fim da Guerra Fria, a disputa ideológica entre o capitalismo e o socialismo. Mas o término da Guerra Fria não pôs fim ao embate entre correntes políticas de esquerda e de direita. Em Governador Valadares, o secretário de Organização do Partido Comunista Brasileiro (PCB), José Rodrigues, o Jó, faz uma avaliação crítica das disputas políticas no município e em nível nacional, desde o período da redemocratização do país, no final da década de 1980.

Jó milita no PCB desde 1985, quando o partido voltou para a legalidade. “Antes eu era simpatizante, mas não tinha contato na cidade”, afirma, recordando-se da clandestinidade do partido durante o governo militar. De lá para cá, o PCB passou por transformações – o antigo dirigente comunista Roberto Freire fundou o PPS, partido que dirige até hoje, mesmo após a recente mudança de nome para Cidadania. “Houve um racha, de onde saiu o PPS, que hoje está quase na extrema-direita. O Oscar Niemeyer dizia que o Roberto Freire não era comunista, era um liberal, e eu achava que o Niemeyer estava gagá. E o Niemeyer estava certo”, observa Jó.

Em Governador Valadares, ele se recorda da participação comunista no governo do falecido João Domingos Fassarella, que foi prefeito pelo PT no início do século XXI. O posicionamento nacional dos petistas durante o governo Lula, com a conciliação com setores da direita, influenciou o rompimento entre PCB e PT em nível nacional, e também em Valadares: “O Fassarella, na primeira campanha, era apoiado por PT, PCB e PDT. No momento que ele ia ganhar as eleições, todo mundo virou Fassarella”.

Para Jó, as experiências petistas com governos causaram um abandono do PT a programas historicamente ligados à esquerda, como a reforma agrária. “O governo Lula, quando abre as alianças, vai fazer conciliação de classe. E não se faz reformas estruturais com conciliação de classe, tem que haver enfrentamento. Chegou o momento em que o PT não tinha adversário, e é muito difícil quando um partido de esquerda não tem adversário à direita. Isso é abandonar a classe trabalhadora para se juntar às elites. Quando o PT chegou ao governo, estava todo fechado com a burguesia nacional. E aí não houve enfrentamento. Em nome da governabilidade, o PT abriu mão do seu programa”, avalia o comunista.

Mesmo com as críticas, ele reconhece que houve avanços sociais durante a gestão de Lula: “Eu falo que o Brasil teve três presidentes, goste-se ou não. Getúlio Vargas, Juscelino e o Lula. O resto só passou pela presidência”. Mas, para Jó, a aliança do PT com setores da direita causou desmobilização e despolitização da base social ligada à esquerda. Essa despolitização, Jó aponta, abriu o caminho para o fortalecimento da direita. Mas ele ressalva que, uma vez no poder, a direita também está sujeita a ser fracionada por disputas internas. Questionado sobre o fim da polarização entre esquerda e direita, ele afirma: “Nada é mais ideológico que essa história de que a ideologia acabou. O mundo nunca esteve tão polarizado quanto hoje”.

Luta de classes

Durante a ditadura militar, muitas organizações marxistas que se opunham ao regime optaram pela luta armada. Embora ainda seja um defensor da revolução socialista, Jó acredita que o mundo atual não comporta essa transformação por meio das armas. Para ele, o caminho atual para as mudanças é por meio da cultura, das artes e da ciência. Jó não deixa de reafirmar a importância da luta de classes, conceito estabelecido no século XIX na teoria comunista de Karl Marx e Friedrich Engels.

“A luta de classes é o motor da história. O mundo só cresce com a luta de classe, com o enfrentamento entre explorados e exploradores. O mundo capitalista hoje está enxertado de socialismo, porque jornada de oito horas de trabalho é conquista da esquerda. Várias coisas dentro do capitalismo hoje foram colocadas pela esquerda. E não foi barato, custou muitas vidas, mas está aí hoje. E socialismo não é voto de pobreza. Eles acham que ser socialista é fazer voto de pobreza”, afirmou.

Candidato a prefeito de Valadares por duas vezes, Jó ainda não sabe dizer se o PCB participará da eleição municipal do próximo ano. Em 2016, o partido não lançou candidatos em Valadares. “Na eleição passada não ia ter debate em televisão e nas escolas. Eu ia fazer o quê na campanha, se minha intenção não era ganhar, era divulgar o partido? Entrar numa campanha dessas para quê?”, questiona. Ele minimiza a importância da política institucional para a promoção de transformações sociais: “Transformação é só com mobilização, com o povo na rua. O Frei Betto diz que política é igual feijão, só funciona panela de pressão. Lula e Dilma desapropriaram menos terras para a reforma agrária que o FHC, porque com o FHC tinha pressão. Aí, no governo do PT, acabou a pressão”.

por THIAGO FERREIRA COELHO

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